O jornal O POVO de ontem, 02 de março, trouxe em uma de suas matérias um questionamento sobre a (in)tolerância sexual em Fortaleza. Intitulada "Barrada no baile", a matéria foi capaz de retratar como a sociedade civil de nossa cidade ainda é atrasada culturalmente em seus conceitos e em sua forma de tratar a diversidade. Acontece que abordagens como essa estão ficando escassas no jornalismo local, que poderia exercer melhor seu papel de fiscalizador dos direitos.
Na ocasião, uma repórter saiu pela noite de Fortaleza acompanhada de um travesti, que é um ator e estudioso da diversidade sexual. Em uma das casas de show, o mesmo foi barrado, sob a alegação de que "a casa só aceita homem vestido de homem e mulher vestida de mulher." E, segundo consta na matéria, a direção do local foi além em seu torpe preconceito: "Nossa casa é heterossexual, não é GLS. Não impedimos que mulheres que gostam de mulheres e homens que gostam de homens entrem, contanto que estejam vestidos de acordo com seu sexo e que não se beijem ou se abracem".
Logo no início da Constituição brasileira, na parte dos Princípios Fundamentais, o Estado assume o compromisso de "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação". Confirmando isso, a matéria traz também a visão de um advogado e de uma especialista em políticas públicas de diversidade sexual.
Ou seja, não se trata de discutir a questão do ponto de vista da religião e dos valores de cada um, como quem acha certo ou errado o homossexualismo e suas implicações sociais e morais. É muito mais que isso. Trata-se de tentar garantir (e a imprensa deveria abraçar mais essa campanha) o pleno direito civil a qualquer cidadão, como prevê a lei. É simples. No referido caso não há o que se discutir, apenas o que se lamentar.
Portanto, a imprensa, que teve comportamento realmente digno na citada matéria, levantando essa polêmica questão, pode ir além em casos semelhantes e fazer muito mais. Assim como os homossexuais, temos outros vários grupos que sofrem com exclusão e preconceitos diariamente, como os negros, os idosos, os meninos de rua, os doentes mentais, os analfabetos, apenas para citar alguns exemplos. Não concordo com a forma de visão que conceitua a imprensa como quarto poder, no entanto, é em pontos como esse que ela pode sim ser um instrumento eficaz de movimentação social e de fiscalização de direitos.
Finalizo com este pensamento do escritor Rui Barbosa, que um século atrás já mostrava uma visão muito clara de imprensa:
"A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que ameaça." (Rui Barbosa).
# Currículo: Marcos Robério: estudante de Jornalismo. Foi coordenador do Núcleo de Jornalismo da ONG TV JANELA; depois trabalhou na assessoria de imprensa da Prefeitura de Fortaleza (estagiário da Secretaria Executiva Regional VI). Atualmente, é repórter estagiário do Jornal O POVO, onde escreve no caderno Vida e Arte. Contatos: email - marcosroberio88@gmail.com e twitter - @marcos_roberio